Compost Tea – Uma poderosa ferramenta da Agricultura Biológica



Foi em 2000 que eu, pela primeira vez, tomei conhecimento dessa poderosa técnica da Agricultura Biológica. A conheci por intermédio da Dra Elaine Ingham que a desenvolveu e a divulgou pelos Estados Unidos, Canadá, Holanda e Australia.

Hoje, pouco importa quem tenha sido o pai/mãe da idéia mas o fato é que foi a Dra Elaine quem mais a estudou, avaliou e a divulgou, e eu tive o prazer de fazer seu curso em 2002 em Indianapolis durante uma das Conferências da ACRES USA e adquirir essa técnica diretamente da sua grande incentivadora .

Naquela época, e ainda hoje, no Brasil os agricultores orgânicos estavam maravilhados com os chamados “biofertilizantes”, que são preparações mal cheirosas e potencialmente perigosas, sob o ponto de vista de saúde humana, e com uma diversidade microbiológica bem mais reduzida que o Compost Tea, e cujo único mérito talvez seja o de agregar micro nutrientes tão em falta nos nossos solos e tão negligenciados pela agricultura convencional.

Esse aporte aleatório de micro nutrientes proporcionado pelos biofertilizantes, de fato, melhorava as culturas principalmente no que diz respeito ao aumento da sanidade das plantas contra doenças e pragas, fato esse que é hoje em dia comprovado cientificamente e isso, na época, era atribuído a um estado de sanidade vegetal quase mítico denominado de “trofobiose”, o qual não era possível de ser explicado pelas idéias tão simplistas e simplórias de Francis Chaboussou, que conseguiu a façanha de ser o autor de um único livro, mas que já foi “re-escrito” após a sua morte umas outras tantas vezes e sempre com um título diferente, como é o caso da mais recente e requentada edição clonada e intitulada “Healthy Crops- A New Agricultural Revolution” na sua versão da lingua inglesa.

Esse livro publicado em 2004, é uma edição em inglês do único livro que Chaboussou escreveu na sua vida cujo título foi “Les Plants Malades des Pesticides” publicado em 1985, mas que nessa re-edição, clonada e requentada em inglês, não faz nenhuma menção sequer a esse fato e consegue uma outra façanha, qual seja de ter o primeiro prefácio de livro psicografado que eu conheço, posto que o referido prefácio foi escrito por um ex-ministro do Collor, José Lutzemberger, em 2004, sendo que essa mesma pessoa faleceu em 2002. Portanto, deve ter psicografado esse prefácio dois anos após a sua morte. Uma façanha digna da Fundação Gaia.

Tendo esse livro como a sua principal “bíblia”, secundado pelo também tradicional “Manejo Ecológico do Solo”, de Primavesi, onde se pode ler , entre outras pérolas, que “a matéria orgânica não tem valor para os solos tropicais (sic) e sub tropicais“, ou que “as substâncias chamadas de ácidos humicos não são solúveis na água, mas de decomposição relativamente fácil (sic)” e conclusões como “a formação de humus (em climas tropicais) é quase impossível (sic)” , e onde a autora consegue errar duas vezes em uma única e pequena frase, não seria de se admirar que o movimento orgânico não conseguisse deslanchar e se desenvolver a contendo no nosso país.

Faltavam autores que realmente conseguissem explicar como a Natureza de fato funcionava no que se refere ao cultivo das plantas. E isso nós já tinhamos em outros países como a Alemanha e os Estados Unidos. Porém, o viés politico ideológico que dominava (e ainda domina), não só a mídia mas também a míope academia brasileira, impediam que as idéias de outros autores fossem introduzidas aqui no Brasil.

Somente aqueles autores que recebiam o “imprimatur” da intelectualidade de esquerda eram considerados confiáveis como Chaboussou, Primavesi, Julius Hensel, etc…

A única e honrosa exceção a essa regra ficou a cargo de Rudolf Steiner e outros autores biodinâmicos devido ao trabalho dos seus discípulos e admiradores da Antroposofia aqui no Brasil.

Vivíamos o que eu chamo de “pré-história” da agricultura orgânica. A idéia geral era a de substituição de insumos. Era quase como se quisessemos fazer uma “errata” da Agricultura Convencional. Pensavamos estar “corrigindo” a agricultura convencional ao adotarmos uma Errata Agrícola.

Ou seja, onde se lê : Nitrogênio, leia-se Torta de Mamona, onde se lê: Potássio, leia-se Pó de rochas, onde se lê: Inseticidas, leia-se Óleo de Neem, onde se lê Fósforo Solúvel, leia-se: Fosfato Natural, onde se lê: Fungicida, leia-se Calda Bordaleza, e assim por diante. As certificadoras sem dúvida tiveram a sua parcela de culpa nessa visão distorcida da realidade.

O problema maior era quando chegávamos em itens como Herbicida ou Nematicida pois não havia nada no universo orgânico que os substituíssem. Pequenos manuais de receitas caseiras foram publicados por autores bem intencionados, porém ingênuos e até pueris, por acharem que uma verdadeira agricultura orgânica se faz com substituições de insumos e com receitas caseiras, mas logo percebeu-se que não era dessa maneira que a Natureza funcionava.

Infelizmente, essa tendência de se escrever e publicar cartilhas sobre agricultura orgânica as custas de dinheiro público, com desenhos e linguagem pueril, se manteve nos últimos 20 anos. Esse tipo de procedimento não é somente reprovável e repreensível, como também presta um grande desserviço aos agricultores por tratá-los como se fossem verdadeiros débeis mentais.

Esse modêlo dava certo em pequenos lotes, geralmente de hortaliças, o que no Brasil, ainda é uma realidade, e gerava produtos com aspectos aquém da qualidade exigida pelos consumidores, o que emprestou aos produtos orgânicos a sua já tão conhecida reputação de feios, abaixo do padrão e caros.

Aqueles agricultores familiares orgânicos por negligência (organic by default) contribuíram ainda mais para essa má reputação do aspecto ruim dos produtos orgânicos, o que gerava, e ainda gera, a já tão conhecida reação dos consumidores de : “Porque eu vou pagar mais por um produto desses tão feio?”, e que só sustenta esse mercado graças ao terrorismo (até certo ponto justificável) que é feito pelos produtores orgânicos com relação ao medo do público aos agrotóxicos. A contaminação generalizada e universal pelo Glifosato até justificaria esse terrorismo.

Entretanto, esse mesmo tipo de terrorismo é exercido pelos fabricantes de venenos agrícolas e autoridades regulatórias para justificar o emprego de agrotóxicos ao acenam com o espectro da fome, o que já sabemos ser uma grande falácia.

Durante essa pré-história (e esse fato se estende mais ou menos até os dias de hoje) os agricultores orgânicos queriam fazer uma agricultura de substituição de insumos. Ou seja, trocar o seis químico pelo meia dúzia orgânico.

Culturas de Cobertura eram chamadas de “Adubação Verde” ou seja, naquela visão distorcida da realidade as plantas de cobertura só serviam a um único propósito, isto é, serem transformadas em adubo. Até hoje, culturas de cobertura são incorporadas no solo com o objetivo de se transformarem em “adubo”.

Não se tinha visão de que as culturas de coberturas além de protegerem o solo contra a insolação, a chuva, o vento, diminuir a temperatura do solo, conservar a umidade e com tudo isso propiciar o desenvolvimento de comunidades microbianas vigorosas, também ajudavam essas mesmas comunidades microbiológicas por excretarem uma grande quantidade de exudatos radiculares compostos de açucares, amino ácidos e ácidos graxos.

Ao fazer isso, com o maior desenvolvimento de raízes propiciavam o desenvolvimento de uma rizosfera vibrante constituida de bactérias de vida livre, bactérias simbióticas, bem como de fungos micorrizicos que produzem constantemente GLOMALINA uma molécula recalcitrante que perdura no solo por dezenas de anos e que ajuda bastante na formação dos agregados de solo, outro componente da fertilidade do solo.

E que todo esse elaborado processo pode ser chamado de qualquer coisa menos de “adubo”. Adubo significa abono. Tem outra conotação e, de fato, tanto não define o efeito protetivo e regenerativo das culturas de cobertura, quanto dificultam o entendimento do seu verdadeiro significado.

A utilização do chamado “Composto Orgânico”, que na época, e até mesmo ainda hoje, poucas pessoas sabiam da sua real finalidade, era visto como um insumo miraculoso, mas também era “decomposto” aos seus teores de N,P e K na hora de se fazer as contas e de se decidir por sua utilização em um manejo orgânico.

Eu tive a oportunidade de explicar o que vem a ser um composto de qualidade, isto é, que tenha microvida suficiente para ser usado como inoculante, em outros artigos que podem ser lidos nesse mesmo blog.

Outros autores como o Prof. David Johnson da New Mexico State University, além é claro da Dra Elaine, também tiveram a oportunidade de esclarecer o que vem a ser um composto de qualidade, qual seja conter uma grande diversidade de comunidades microbiológicas destinadas a regenerar a fertilidade perdida do solo.

Desde que começei a me interessar por métodos agrícolas alternativos que eu tenho observado uma admiração que beira a religiosidade pelo composto orgânico aeróbico que não se justifica. Na Natureza temos tantos processos aeróbicos como anaeróbicos e ambos são muito interessantes e podem ser usados em nosso benefício.

Porém, se quisermos fazer Compost Tea vamos ter que usar o Composto Orgânico aeróbico de qualidade e o conselho que eu dou a todos que querem fazer um Compost Tea com qualidade é a de que usem o Vermicomposto (Humus de Minhoca) até que tenham atingido um estágio tal de maestria na fabricação de composto que lhes permitam usar o tradicional composto orgânico aeróbico rico em micro vida.

A critica que a Dra Elaine faz ao Vermicomposto é a de ele tem mais bactérias do que fungos, ou seja, é um composto predominantemente bacteriano. Ela até se dá ao trabalho de explicar como se faz um composto aeróbico “equilibrado” para fins de utilização para Compost Tea, porém é trabalhoso, demorado e dependendo de quem faz, nem sempre dá bons resultados. Um ex-aluno dela que veio ao Brasil protagonizou recentemente um grande fiasco na região de Tangará da Serra em MT ao tentar fazer o tal de “composto equilibrado”.

Fazendo o seu próprio composto equilibrado para ser extraído

Eu desenvolvi o meu próprio método que consiste em usar de 5 a 10% de farelo de arroz (o preferido, mas que pode ser substituído por farelo de trigo ou de aveia) misturado ao Humus de Minhoca (Vermicomposto) , ligeiramente umedecido (não exceder a 30% de umidade) e colocado em um saco plástico. Espera-se o período de uma semana para que os fungos cresçam e tenham tempo de colonizar todo o composto formando um bloco sólido que as vezes até precisa ser destorroado antes de ser usado no tanque de compost tea. Essa seria, então, a primeira receita, ou seja, de como transformar um composto bacteriano em equilibrado entre fungos e bactérias em apenas uma semana.

Condições aeróbicas durante todo o processo

Para se fazer um Compost Tea vamos precisar de um tanque de extração e de multiplicação. Na internet você irá ver um grande número de projetos mas, na minha opinião, os que se prestam melhor a essa tarefa seriam os que usam os insufladores de ar tipo ventoinhas, como por exemplo BUSCH modelo SB0050 ou SI 0045 ou similar, e que sejam capazes de insuflar ao redor de 90 a 150 m3 de ar / hora, para que as condições sejam francamente aeróbicas, isto é, que tenham níveis de Oxigênio acima de 6 ppm, para tanques de 1000 a 2000 litros de água.

Formatos redondos facilitam a boa limpeza que deve ser bem feita para evitar a formação de biofilmes de organismos anaeróbicos que poderão interferir nas suas extrações futuras. Essa foi a principal razão do insucesso dessa técnica aqui no Brasil pois começamos usando bombas centrifugas que somente são boas para a multiplicação de bactérias mas que também são de difícil limpeza e exigem que o composto seja contido dentro de um recipiente de tela para evitar o entupimento da bomba.

De maneira alternativa pode-se usar também aqueles oxigenadores para tanques de peixe que agitam adequadamente a mistura e fornecem ar suficiente para a manutenção de condições aeróbicas.

Resumindo: Condições aeróbicas, agitação adequada e projeto fácil de limpar após a utilização do Compost Tea.

Eu pessoalmente prefiro colocar o composto diretamente na agua e depois do fim do ciclo filtrar ou coar dependendo do uso que se queira dar, ou seja, rega ou pulverização, mas há quem o coloque dentro de sacos de telas plásticas com menos de 500 micras, geralmente 200 micras.

O tempo de extração deve ser de no mínimo 24 horas. Recomenda-se não elevar o nível do liquido até muito próximo a borda dos tanques porque a multiplicação principalmente das bactérias produz uma grande quantidade de espuma que poderá ser diminuída com o uso de anti espumante ou até mesmo de óleo vegetal. Essa grande produção de espuma pode fazer transbordar .parte do conteúdo da solução e isso não é interessante

O que adicionar para fazer o Compost Tea

O composto é o principal ingrediente. E a quantidade vai depender muito da qualidade do composto. Quanto melhor usa-se menos composto, mas com aquela mistura de Humus de Minhoca com farelo de arroz, umedecida e fermentada por uma semana, a quantidade de 20 gramas por litro já são suficientes.

No início o melaço era o nutriente preferido de quem fazia Compost Tea, porém após algum tempo a Dra Elaine passou a desaconselhar o uso do melaço. Eu, entretanto, discordo dessa recomendação e creio que o nivel de 1% é adequado e suficiente. Então, 1% de melaço liquido.

Depois três outros ingredientes você vai encontrar em 90% das receitas de Compost Tea. São eles o Acido Húmico, Kelp (extrato de Ascophyllum nodosum) e Hidrolisado de Peixe.

Com relação ao hidrolisado de peixe procure algum produto feito por fermentação a baixas temperaturas e que utilizem de preferência um processo enzimático eficiente para que o produto possa ser utilizado principalmente pelas bactérias. A quantidade vai depender da qualidade do produto mas geralmente de 1 a 2 ml por litro de agua já seriam suficientes.

Acido húmico liquido usa-se também de 1 a 2 ml por litro e Kelp 1 ml por litro de água.

Ultimamente eu tenho usado também um pouco de Pellets de Alfafa na dose de 5 a 10 gramas por litro.

Os ingredientes acima mencionados foram os nutrientes que tanto a pesquisa quanto o uso continuado por centenas de produtores demonstraram ser os melhores para multiplicar tanto bactérias quanto manter os fungos em suspensão até serem adicionados ao solo ou a lavoura.

Evitem o uso de outros ingredientes que não serão usados pelos microrganismos em um espaço de tempo curto como 24 horas como por exemplo pós de rocha, fubá, farelos de qualquer natureza, ou qualquer outro ingrediente mais exótico. Essas escolhas realmente não são muito inteligentes.

Após um ciclo de 24 horas as bacterias terão se multiplicado enquanto que os fungos serão adequadamente extraídos pois o ciclo de 24 horas não permite a sua multiplicação adequada. Essa solução será rica em acidos humicos, reguladores de crescimento, e terá a nutrição natural e suficiente tanto para as plantas quanto para inocular o solo com a necessária microbiota.

Como toda arte, só se desenvolve e se aprofunda o conhecimento com a repetição, ou seja fazendo e repetindo por várias vezes.

É a forma mais democrática de se adicionar a microvida contida no composto de qualidade em grandes áreas, que de outra maneira não seria possível ou seria financeiramente viável.

Desejo a todos uma boa extração e uma boa fermentação.

José Luiz M Garcia
Instituto de Agricultura Biológica

Referências

PUBLICADO POR
Dr Vinagre PhD – Agrônomo, Fisiologista e Bioquímico de Plantas. Produtor Biológico. Escritor. Consultor.

Fonte: Instituto de Agricultura Biológica